Este ano estão no Web Summit 2600 startups, cerca de um terço foram fundadas por mulheres e 296 (11%) têm sede em Portugal. Nos pavilhões da FIL há uma espécie de hora de ponta que dura quase todo o dia. Há gente apressada para chegar a uma talk, há os que procuram ideias entre as startups. Há quem corra atrás dos brindes e quem ainda não saiba bem onde vai e passeie lentamente pelos corredores, enquanto vê as notificações no smartphone.
Há de tudo, como é hábito, e muitas ideias novas para mostrar, num ano em que a quantidade de soluções B2B se destaca, muitas delas orientadas para melhorar processos com a ajuda da inteligência artificial. Este é um ano em que também voltam a dar nas vistas os chamados projetos de impacto, com muitas soluções na área da sustentabilidade. Muitos deles para ajudar as empresas a reduzirem a pegada de carbono. Muitos outros com a ambição de criar impacto noutras áreas, como a educação ou a saúde.
A proposta da Actif está nesse leque. Leva à feira uma plataforma com programas personalizáveis de exercício físico e cognitivo através de conteúdos digitais para idosos, a pensar sobretudo em quem está em lares ou residências, onde os recursos normalmente são escassos para promover atividades que a Organização Mundial de Saúde considera críticas para o bem estar físico e mental daquela população.
O projeto nasceu pela mão de Sara Gonçalves, que se inspirou na experiência da avó com Alzheimer para criar uma solução com atividades alinhadas com as capacidades de cada utente ou grupo de utentes, nestes espaços, como explicou a empreendedora ao SAPOTeK.
A plataforma aloja diferentes tipos de conteúdos vídeo, dos jogos ao exercício físico, que são criados por uma equipa própria e trabalhados com o algoritmo da empresa, que multiplica as atividades disponíveis em função de diferentes preferências, limitações ou necessidades de quem as vai fazer. Estão já disponíveis cerca de 5 mil conteúdos. O mesmo algoritmo permite definir programas de atividades personalizados para cada grupo de utentes de uma instituição, em função de um conjunto de dados pré-partilhados sobre esses utentes.
Em Portugal, a Actif tem clientes como a Misericórdia do Porto e está a iniciar um piloto com a Medis, que vai envolver 300 pessoas. Já fez outros pilotos fora do país e prepara-se para dar o primeiro passo na internacionalização. Vai acontecer em 2024, no Reino Unido.
A startup criada por Joel de Oliveira Junior também partiu de uma história pessoal. A perda de um filho para o cancro. O fundador da LuckieTech, ex-gestor de uma multinacional no Brasil e engenheiro industrial de formação, mudou de vida para tentar salvar as vidas de outras crianças em tratamento de cancro, com a ajuda da tecnologia.
A LuckieTech desenvolveu, e está ainda a aperfeiçoar, um sistema de monitorização remota para pacientes com cancro. Trata-se de um pequeno dispositivo que a criança cola na axila. Tem um localizador e, a cada cinco minutos, comunica sinais vitais à unidade de saúde que a acompanha, via cloud, para um dashboard onde o médico vai poder acompanhar a evolução de cada parâmetro monitorizado.
Para o doente é uma garantia extra de que a fragilidade do seu sistema imunitário, decorrente da doença, está a ser vigiada por profissionais de saúde (sinais de febre, por exemplo). Para as unidades de saúde pode representar uma poupança anual de milhares de euros, detetar riscos de forma precoce e antes de a única resposta possível ser o internamento do paciente em unidades de cuidados intensivos.
Joel de Oliveira explicou ao SAPO Tek que o tratamento do cancro representa um encargo mensal à volta de 6 mil euros para as entidades de saúde, entre 45 a 60% decorrentes de internamentos por intercorrências relacionadas com a fragilidade do sistema imunitário dos pacientes.
A LuckieTech contou com parceiros de peso para criar a solução que veio mostrar ao Web Summit: a Johnson & Johnson colaborou no desenvolvimento do adesivo que cola o sensor à pele; a Embraer no design do dispositivo de carregamento.
A tecnologia está em prova de conceito no hospital de Barretos em São Paulo, a maior unidade de saúde de tratamento do cancro no Hemisfério Sul, segundo o empreendedor, que mesmo ainda sem uma oferta comercial, já conseguiu estender o sonho de contribuir para salvar a vida de crianças em tratamento do cancro, a um universo mais vasto. A tecnologia está a ser experimentada transversalmente, em pessoas com diferentes idades. Em Portugal, já foi feita uma demonstração no IPO, como revelou ao SAPO TeK Joel de Oliveira.
A LuckieTech é uma das startups a representar o Brasil no evento, que este ano volta aliás a ter uma forte representação no Web Summit de Lisboa. Com a ApexBrasil vieram 85 startups e mais 100 empresas, numa comitiva que duplica a do ano passado e que é complementada por outras delegações com mais de 500 empreendedores brasileiros, segundo dados oficiais.
No universo das startups portuguesas várias iniciativas abriram as portas da FIL a novos projetos, como o programa Road 2 Web Summit, promovido pela Startup Portugal, em parceria com o Web Summit, que este ano selecionou 115 startups para exporem na feira. As eleitas têm uma média de dois anos de existência e, em conjunto, terão levantado já 13 milhões de euros em investimento. Pode ver a lista completa aqui. Outra iniciativa nacional que leva este ano vários projetos à feira é a Unicorn Factory Lisboa, com expositor logo junto à entrada do primeiro pavilhão da FIL.
Por toda a feira há muitas outras propostas para ver, como a “Uber à portuguesa”, a iXat. A expressão é nossa, porque a iXat prefere demarcar-se das comparações, mas na verdade quer afirmar-se como uma alternativa aos serviços de transporte da Uber ou da Bolt, com um modelo de negócio mais amigo dos condutores e com uma imagem mais “friendly”.
A taxa cobrada aos motoristas pela iXat é de cerca de metade da cobrada por serviços como o da Uber. Outra diferenciação que a plataforma quer assinalar é a exigência que impõe aos seus motoristas de falarem português, independentemente da nacionalidade que possam ter, como explicou ao SAPOTek a co-fundadora Elisabete Oliveira.
A iXat começou com estafetas e mototaxis. Está a lançar uma nova versão da app, que passa a suportar pedidos de viagens de carro e quer continuar a acrescentar serviços de mobilidade. A ideia é ir respondendo às necessidades de quem precisa de deslocar, a si ou bagagens, em diferentes situações e explorar oportunidades de parcerias no interior, com autarquias por exemplo, onde as opções de transporte são mais limitadas.
Os chatbots são outra presença destacada no Web Summit, como não podia deixar de ser. A Casperaki desenvolveu um para ajudar quem gosta de música a criar os seus próprios sons. É ele que vai interagindo com o utilizador para perceber que ingredientes deve juntar à composição para criar um resultado final que agrade ao “mestre de cerimónias”. O software está em beta, ainda em fase de melhoria, mas quem quiser experimentar pode fazê-lo, porque para já é gratuito.
É igualmente possível encontrar várias soluções relacionadas com animais domésticos, até redes sociais, assistentes de moda, ou propostas para promover ou tirar mais partido do trabalho remoto, como propõe a Work Remote, que quer ajudar os seus utilizadores a encontrar empregos que possam ser realizados em formato remoto.
Esta é, na verdade, uma das novas funcionalidades da plataforma, complementando a sua oferta de treinos e cursos de formação, ajudando os utilizadores que optem também por um modelo de free lance ou na construção do seu negócio online. A plataforma pretende ser igualmente um centro de recursos para quem procura emprego, ajudando no CV e em cartas de apresentação.
Da Ásia, também chegaram este ano a Lisboa várias propostas. No pavilhão 5 da FIL vai poder encontrar uma ilha com startups do Japão (estão cá 16). Na lista oficial do Web Summit verifica-se ainda que estão cá mais de 30 startups indianas, nove chinesas e muitas outras de diferentes países e regiões asiáticas. É o caso da VM-FI, a única startup de Taiwan no evento, que mostrou no primeiro dia do Web Summit o VMfi TransAnywhere, uma solução de tradução de voz em tempo real que permite a comunicação bidirecional entre duas pessoas de línguas diferentes. Para já, terão de falar japonês e inglês.